Quando tomou posse, afirmou que os seus antecessores tinha trilhado um caminho dinâmico na promoção do triatlo. Depois de um ano no cargo, essa dinâmica mantém-se? Em que foi melhorada
O Triatlo é uma modalidade recente e com óbvias dificuldades de implementação e crescimento, pela logística, valor e empenho associados. Apesar dessas adversidades o trabalho desenvolvido pelos meus antecessores, onde saliento a visão de José Luís Ferreira, permitiu a conquista de uma medalha olímpica e um desenvolvimento do Alto Rendimento que trouxe o Triatlo para o conhecimento público. Contudo, na minha análise do triatlo, interessava agora cimentar parcerias e novos programas que desmistificassem e desconstruíssem a modalidade, afastando a imagem de super-homem e de dedicação e esforço extremo para se ser triatleta. Concretamente em relação à sua pergunta, e apesar de uma ideia concisa do que fazer e de já conhecer a “casa”, o primeiro ano é sempre dedicado à avaliação interna, à aproximação aos parceiros e à criação de bases de trabalho que nos permitam desenvolver então as políticas que defendemos. Ou seja, apesar de visivelmente não ter sido feito grande trabalho, acho que foram criados bons alicerces para aquilo que começámos já a implementar em 2018.Quais os desafios que se colocam às modalidades representadas pela federação, sendo tão técnicas e com tantas especificidades ao nível do treino, do local de treino e do tempo necessário para os atletas se prepararem para as provas?
Penso que o grande desafio é precisamente mostrar que assim não é! É certo que um bom triatleta é provavelmente um dos indivíduos que mais treina e mais se embrenha numa modalidade, mas essa é uma perspetiva de competição e não de participação. Para participar, qualquer pessoa consegue dar umas braçadas, pedalar e correr e é assim que os grandes campeões começam. Portanto, o grande desafio é comunicar isso às pessoas e criar as condições para que elas experimentem triatlo pela primeira vez. Depois disso a modalidade faz o seu trabalho!
Disse, também, na sua tomada de posse, que o desenvolvimento da modalidade deve centrar-se nos clubes. Essa tarefa tem sido bem-sucedida? Há organização e profissionalismo suficientes nos clubes, ao ponto de assumirem essa responsabilidade?
Este assunto é uma pescadinha de rabo na boca! Se não houver responsabilização das pessoas, das entidades e dos clubes, eles não crescerão e não adquirirão novas competências. A Federação de Triatlo sempre foi muito centrada em si mesmo, fruto da sua dimensão e de um projeto necessariamente centrado no Alto Rendimento. Mas, se queremos abrir a modalidade a todos, temos de passar o poder, o conhecimento e as ferramentas para os clubes e demais agentes, para que estes possam desenvolver-se e, com isso, desenvolver a modalidade. Apesar disso, atualmente o Triatlo possui já um conjunto de treinadores e dirigentes de enorme valia, seriamente empenhados no desenvolvimento da modalidade e que são parceiros preferenciais da Federação.
Na primeira prova de duatlo em Braga, durante os primeiros meses da Cidade Europeia do Desporto, João Ferreira, da Tribraga, dizia-nos que era muito difícil organizar provas devido a todas as questões burocráticas relacionadas com a ocupação de espaço, autoridades, etc. Acha que deveria haver mais sensibilização direcionada para as entidades, no sentido de facilitar as organizações?
É relativo… obviamente que a simplificação de procedimentos é essencial, mas é necessário assegurar todos os pressupostos de segurança e legitimidade para organização dos eventos e a burocracia existente decorre precisamente da necessidade de contrariar as más organizações ou a falta de segurança. Compreendo que é difícil reunir todas as autorizações e dominar todas as vertentes dos eventos e concordo que o processo poderia ser mais fácil, mas também concordo que este modelo oferece aos praticantes as medidas mínimas de segurança e credibilidade.
Quantos atletas há em Portugal (femininos e masculinos) federados?
Neste momento, a FTP tem 2820 federados, prevendo chegar ao final do ano com cerca de 3500 atletas, o que representa um aumento de cerca de 25% face a 2017 e registando-se um crescimento contínuo de cerca de 10% anuais na última década.
“Há um lote de atletas que podem fazer resultados históricos em Tóquio”
Com Vanessa Fernandes, o Triatlo passou a fazer parte do nosso dia-a-dia, porque houve uma cobertura mediática condizente com a capacidade e resultados dela. O que falta para haver uma continuidade que, imagino, todos desejam na federação?
A Vanessa é uma atleta singular, com capacidades únicas e que ajudou a trazer o triatlo para a ribalta. Neste momento, a FTP possui mais um lote de atletas com enorme potencial e que nos colocam na expectativa de excelentes resultados em Tóquio, onde se destacam a Melanie Santos e a regressada Vanessa fernandes, bem como João Pereira e João Silva ou a nova promessa Vasco Vilaça. Estes atletas têm entre eles vários títulos europeus e mundiais, sendo amplamente reconhecido o seu potencial e garantindo a continuidade do projeto.
Acha que a atividade de uma instituição como a que preside é demasiado escrutinada em função de medalhas olímpicas? Não acha que isso é limitativo?
Se calhar vou ser demasiado cáustico, mas acho que o Português tem uma ideia distorcida do desporto (ou então sou eu que tenho!). Até entrarmos neste século o desporto apenas reconhecia o campeão, o melhor, sendo uma forma de afirmação pessoal que, obviamente, valoriza a obtenção de medalhas olímpicas. Já neste século começou a perceber-se que o desporto afinal é benéfico para a saúde e que toda a gente tem de se mexer… mas sempre aprendi que o desporto é uma forma de arte, de cultura e, acima de tudo, de socialização, que o desporto é determinante para a formação da cidadania, para desenvolver a concentração, a vida em comunidade, a velocidade de raciocínio, o voluntarismo, a cooperação, entre inúmeras outras vantagens… Em suma, enquanto o Português reduzir o desporto aos títulos alcançados e enquanto os índices de prática desportiva andarem pelos 20%, sem que a generalidade da população saiba o que significa ser desportista e as vantagens que daí advém, seremos sempre escrutinados desta forma, qual adeptos de bancada à espera que o clube ganhe a qualquer preço.
Braga é Cidade Europeia do Desporto 2018. Que mensagem quer enviar para a organização e para os bracarenses, nomeadamente, os que praticam as modalidades que representa a Federação de Triatlo de Portugal?
Os eventos são a melhor forma de homenagear os hábitos de prática e de louvar o trabalho diário! São também uma excelente semente para que mais gente se converta em desportista e encontre a sua modalidade e a sua forma de realização! Assim, que este seja um evento para lançar sementes e para louvar o trabalho que os clubes, treinadores, dirigentes e atletas bracarenses, reforçando as condições e os incentivos para que estes mantenham a sua ligação às suas modalidades por muitos anos! Apesar dos inúmeros eventos desportivos que já se desenrolarem em Portugal, o evento que mais me marcou foi a Expo98, pela sua capacidade de reinventar a cidade de Lisboa! De facto, ainda hoje, passados 20 anos, o impacto do evento está aos olhos de todos e vivemos uma melhor cidade de Lisboa graças a esse evento! É essa mensagem que deixo a todos aqueles que suam para fazer deste um ano desportivo inesquecível em Braga!
PERFIL
O presidente da Federação de Triatlo de Portugal é natural de Sintra e está ligado ao desporto desde que se conhece: “Sempre pratiquei desporto. Apesar de ter feito 10 anos de natação, pedalar e correr, nunca fui triatleta a sério. A minha ligação ao triatlo tem raízes profissionais, através da organização de provas. Sou licenciado em gestão do desporto e comecei a trabalhar na CM Oeiras, onde organizava o Triatlo do Ambiente, forma como comecei a contactar com a modalidade. Acabei por ser convidado para trabalhar na modalidade e a relação foi evoluindo. No mandato anterior, tive algumas divergências quanto ao rumo do triatlo e resolvi sair e candidatar-me, tendo ganho as eleições”. Tomou posse em Janeiro de 2017.